A crise econômica que atingiu a Europa nos últimos anos teve um impacto particularmente significativo no mercado de trabalho da Espanha, onde, de acordo com dados oficiais, o desemprego fechou 2013 em 26%.
Em quase 2 milhões de lares espanhóis, todos os membros da família estão desempregados e há casos em que o única fonte de renda é a aposentadoria recebida por avôs ou avós.
Mas uma faixa da população destoa do restante dos espanhóis na busca por vagas para trabalhar. Entre o início da crise, no final de 2007, e o final do ano passado, o nível de ocupação das mulheres com mais de 45 anos na Espanha cresceu 18% – enquanto que o de homens com a mesma faixa etária caiu 7%.
A cifra consta de um estudo divulgado pela Associação de Empresas de Trabalho Temporal (Asempleo), baseado em dados oficiais do Instituto Nacional de Estatísticas.
Os números mostram uma perda de 281,9 mil postos de trabalho entre os homens maiores de 45 anos. Já entre as mulheres, houve um aumento, para 467,3 mil, de vagas de trabalho ocupadas, também desde o fim de 2007 até o fim do ano passado.
Donas de casa
Segundo o estudo, esse aumento no número de mulheres com mais de 45 anos empregadas se deve a vários fatores, entre eles o fato de elas ocuparem vagas em setores que criaram empregos no período, ao contrário de áreas onde os homens geralmente são a maioria.
Setores tradicionalmente masculinos, como construção civil e indústria, foram os mais afetados pela crise, enquanto que setores como serviços absorveram mais mulheres.
Além disso, com a crise na Espanha, o aumento do desemprego e os cortes na área social do governo, a mulher que antes não procurava ativamente um emprego por se dedicar em tempo integral às tarefas do lar teve de se incorporar ao mercado de trabalho para ajudar a família.
Analistas da Asempleo destacam que esse comportamento está associado ao fenômeno conhecido como “o efeito do trabalhador adicional”.
Esse fenômeno se dá quando o chefe de família perde o emprego e os demais membros do lar saem ao mercado de trabalho para amenizar a perda da renda familiar.
Dados oficiais indicam que 831.500 donas de casa foram trabalhar fora desde o início da crise no fim de 2007, enquanto quase 200 mil mais homens passaram a se dedicar às tarefas do lar.
Maria Dolores Mirón Torrent, 49 anos, trabalhava como vendedora quando engravidou do primeiro filho e optou por deixar o emprego e se dedicar somente à família.
Ela vinha atuando como dona de casa havia quase uma década quando o marido ficou desempregado, e viu a necessidade de voltar a trabalhar.
“As oportunidades para mulheres da minha idade estão nos serviços de limpeza e no cuidado de crianças e idosos. Não era o que eu queria fazer”, lembra Dolores, que resolveu aceitar as ofertas que apareceram.
Demitida após 35 anos
Um outro fator apontado no estudo é que as espanholas com mais de 45 anos têm buscado se aprimorar, fazendo cursos, tornando-se assim mais capacitadas para o mercado.
O número de desempregadas maiores de 45 anos que estudam é de 86,1 mil, bem acima dos 29,6 mil registrados no final de 2007. A taxa de desemprego entre os espanhóis maiores de 45 anos que têm nível superior é de menos de 10%, segundo dados oficiais.
Em abril do ano passado, a agente de viagens Montserrat Martínez Merlos, 55 anos, foi despedida da empresa onde trabalhou por 35 anos.
“Senti impotência, estava sem perspectivas de futuro. Quando me vi desempregada aos 55 anos, chorei muito. Mas decidi ir à luta”, lembra.
Após tentativas frustradas de ser contratada por alguma empresa, resolveu fazer cursos de idiomas e de novas tecnologias.
Com a experiência que acumula no setor, começou a trabalhar como agente de viagens por conta própria. “A única saída que encontrei foi empreender”, diz.
Piores condições
Nesta conjuntura, as mulheres passaram a ter mais acesso ao mercado de trabalho, mas em piores condições: os novos empregos são principalmente em tempo parcial, temporários e com salários reduzidos.
“O aumento da ocupação feminina reflete que esses ‘miniempregos’ são ocupados principalmente por mulheres”, analisa Isabel Ávila, presidente da Confederação Espanhola Organizações de Donas de Casa, Consumidores e Usuários (CEACCU, na sigla em espanhol).
Almudena Fontecha, secretária para a Igualdade do Sindicato União Geral dos Trabalhadores (UGT), concorda que “os resultados mostram maior deterioração de condições laborais”.
“Taxa de atividade não se traduz em taxa de emprego”, explica Fontecha. Segundo ela, ainda há uma segregação muito importante em áreas tradicionalmente masculinas.